29 de junho de 2007

"Os imparáveis lambe-botas"

Um excelente texto da Drª Claudia Cardoso no Açoriano Oriental de hoje e que aqui transcrevo na integra por estar disponivel apenas para assinantes.
Ainda consigo vê-los. Mãos enérgicas a meio-peito a falarem com as professoras. Com trejeitos a mais nos corpos pequenos os meninos graxistas desunhavam-se para subir na vida.
Penso que me vem daí este nojo absoluto aos lambe-botas. Que apenas partilho com o asco aos delatores.
Os lambe-botas eram uma classe organizada na primária, que superava as falhas da inteligência com um pronto tratamento privilegiado à professora. E ela, meio surpresa, meio encantada, deixava-se embalar no canto manhoso de fim de período.
Talvez por isso a adulação tem ainda este cheiro nauseabundo da falta de rectidão e os aduladores mantenham agarrado à pele o cheiro putrefacto da carne em acelerada decomposição. Tristemente o gang continua a crescer. É vê-los por aí. Mesmo à solta! Acérrimos defensores dos poderosos, dos que ocupam cargos de chefia ou postos de comando. Da tesouraria da junta aos meandros dos partidos.
Os meninos lambe-botas cresceram nos trejeitos. Agora são mais elaborados, ensaiam-se ao pormenor e escolhem a dedo as próximas vítimas. Na tibieza dos seus princípios escolhem também os lugares em que se movem, as mãos que apertam, os deuses a quem idolatram como se coleccionassem cromos. E vêm de mansinho, sem que se dê muito por eles. Não despertam qualquer paixão. Só compaixão. De dedos entrelaçados e voz sumida vão embalando os supostos poderosos nos seus ardis.
A manha envolve-os como se fosse um perfume. E fá-los hábeis. Usando a falta de vergonha em lugar da competência e a disponibilidade total em vez da inteligência. Solícitos, como é seu timbre, prontificam-se a tudo fazer para agradar ao chefe. Mesmo que o chefe, engano supremo, consiga ser um lambe-botas ainda maior do que eles. Sendo certo que as botas que lambe são outras, naturalmente. Não necessariamente melhores. Nem necessariamente isentas, porque o dono destas botas tem sempre outras botas às quais há-de também saber lamber.

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